Marco temporal: como foi o primeiro dia de julgamento no STF
Decisão pode colocar fim em décadas de insegurança jurídica, litígios intermináveis e conflitos fundiários
O Supremo Tribunal Federal (STF) encerrou nesta quarta-feira (10) o primeiro dia de julgamento de quatro ações que discutem a validade da tese do marco temporal para demarcação de terras indígenas nos autos de processos com repercussão geral.
Todas elas têm a relatoria do decano da instituição, ministro Gilmar Mendes.
Após a leitura do relatório, falaram as partes envolvidas nas ações: Progressistas e Congresso Nacional (que pedem a constitucionalidade da lei) e PSOL, PCdoB, PV, PT, PDT e a Articulação dos Povos Indígenas, que defendem sua inconstitucionalidade.
A sessão, dedicada às sustentações orais das partes envolvidas, foi marcada por embates intensos, ressaltando a complexidade do tema e sua importância para o futuro da segurança jurídica envolvendo terras no Brasil.
O julgamento continuará nesta quinta-feira (11), quando serão concluídas as manifestações orais; ainda não há data definida para a votação do placar final.
O marco temporal é uma tese jurídica construída no julgamento de casos de demarcação de terras indígenas no STF, defendendo que povos indígenas só teriam direito à demarcação de territórios se comprovassem ocupação na data de promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988, ou ainda estivessem em disputa judicial nessa mesma época.
Essa regra foi declarada inconstitucional pela Corte em 2023, mas voltou à pauta devido à derrubada do veto presidencial sobre o tema e à entrada de novas ações que questionam a aplicação da tese.
O início da análise do tema pelo Supremo acontece um dia após o Senado aprovar uma proposta de Emenda à Constituição (PEC) que define a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas. A matéria segue para a Câmara dos Deputados.
O que aconteceu no primeiro dia
Durante o primeiro dia de julgamento, representantes de diferentes grupos, como entidades indígenas, advogados, partidos políticos e setores favoráveis à tese do marco temporal, apresentaram seus argumentos aos ministros.
Uma das advogadas de grupos indígenas relatou casos de comunidades que foram expulsas de suas terras por grandes obras ou conflitos armados, ressaltando que tratar essas áreas como “perdidas” apenas por não terem sido ocupadas em 1988 viola direitos fundamentais.
Do outro lado, advogados e representantes do Congresso e de partidos como o Progressista (PP) defenderam a regra, afirmando que o marco temporal trará maior segurança jurídica e previsibilidade aos processos de demarcação.
A argumentação ressaltou a necessidade de um critério objetivo para evitar litígios intermináveis e conflitos fundiários. Outras sustentantes apontaram que a Constituição também protege terceiros de boa-fé com títulos de terra registrados, buscando equacionar a proteção de direitos indígenas com a estabilidade de propriedades privadas.

Os advogados do Congresso também demonstraram a falta de objetividade no artigo 231 da Constituição Federal, o que abriria margens para interpretações difusas acerca dos direitos dos indígenas.
A retomada do julgamento dois anos após a primeira decisão do STF coloca em evidência o choque institucional entre o Judiciário e o Congresso Nacional.
Em 2023, o STF considerou a tese inconstitucional e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou a Lei 14.701/2023, que havia sido aprovada pelo Legislativo para validar o marco temporal.
No entanto, o Congresso derrubou o veto, restabelecendo a regra de que territórios só podem ser reconhecidos se atendiam à condição temporal, o que provocou novas ações judiciais no STF.
A decisão da Corte poderá confirmar a inconstitucionalidade da tese, reformando a jurisprudência, ou reabrir a possibilidade de aplicação do marco temporal, o que alteraria a lógica de demarcações no país e impactaria milhares de processos em andamento.
Com a continuidade das sustentações orais previstas para esta quinta-feira, o STF ainda terá a oportunidade de ouvir todos os argumentos antes de iniciar a fase de análise das teses jurídicas.
A expectativa é de que o julgamento ganhe ainda mais importância nos próximos dias, especialmente diante da pressão política e social que envolve o tema.








Comentários (0)
Comentários do Facebook