Algodão: exportação forte e cautela no mercado interno

O algodão brasileiro ganha o mundo enquanto o mercado interno pisa no freio

Algodão: exportação forte e cautela no mercado interno
Ilustrativa

A safra 2024/25 de algodão avança a passos largos no campo, e com ela, um cenário de duas velocidades se desenha para o produtor. De um lado, o ritmo das exportações ganha força, prometendo volumes recordes e sustentando as cotações. Do outro, o mercado doméstico mostra-se cauteloso, com as indústrias têxteis comprando apenas o necessário para o curto prazo. Este cabo de guerra entre a forte demanda externa e a retração interna cria um ambiente complexo, mas cheio de oportunidades para quem entende os movimentos do mercado.

Com o beneficiamento da pluma já ultrapassando a metade da produção, segundo dados do Cepea, é hora de analisar os fatores que estão moldando o presente e o futuro desta commodity tão vital para o agronegócio brasileiro.

O avanço do beneficiamento e a preparação para o mercado

Quando falamos em beneficiamento do algodão, estamos nos referindo a uma etapa crucial que transforma a matéria-prima colhida no campo no produto que será comercializado: a pluma. Esse processo, realizado nas usinas de beneficiamento, separa a fibra (pluma) das sementes e de outras impurezas. O avanço dessa fase, que já passou da metade da safra, significa que um volume expressivo de pluma de alta qualidade está pronto para abastecer tanto os portos quanto as fiações nacionais. É a partir daqui que o destino do algodão brasileiro começa a ser traçado, seguindo para os contêineres de exportação ou para os teares da indústria nacional.

O Brasil, consolidado como um dos maiores produtores e exportadores mundiais, tem na eficiência do seu parque de beneficiamento um grande diferencial competitivo. A qualidade da pluma, medida por características como comprimento, resistência e uniformidade da fibra, é determinante para o preço final. Produtores nos gigantes estados produtores, como Mato Grosso e Bahia, investem pesado em tecnologia desde o plantio até essa etapa final, garantindo um produto que atende às exigências dos mercados mais sofisticados do planeta. Esse cuidado na produção é o que abre as portas para o cenário positivo que vemos no mercado externo.

Exportações a todo vapor: a pluma brasileira veste o mundo

O cenário internacional é, sem dúvida, o grande motor do mercado de algodão brasileiro no momento. Com os embarques ganhando ritmo em outubro, as projeções indicam que o volume exportado pode superar a marca de 300 mil toneladas no mês, um recorde para o ano. Essa performance robusta é resultado de uma combinação de fatores, incluindo a excelente qualidade da safra brasileira e a forte demanda de países asiáticos, como China, Vietnã, Bangladesh e Turquia, que são os maiores centros de produção têxtil do mundo. Eles confiam na fibra do Brasil para produzir desde roupas até artigos de cama, mesa e banho.

Esse apetite do mercado externo impacta diretamente o preço que o produtor recebe. O conceito de paridade de exportação se torna o principal balizador das cotações internas. De forma simples, a paridade é o preço que a indústria nacional precisa pagar para competir com o comprador internacional, levando em conta a cotação na bolsa de Nova Iorque (ICE Futures) e a taxa de câmbio. Quando o dólar está valorizado e a demanda externa aquecida, a paridade sobe, puxando os preços internos para cima e garantindo boa rentabilidade para o cotonicultor que vende sua produção para o exterior.

Mercado doméstico cauteloso: o freio da indústria têxtil

Enquanto a pluma de algodão viaja para outros continentes, o cenário dentro de casa é de maior prudência. As indústrias têxteis nacionais, que transformam a pluma em fios, tecidos e, finalmente, em produtos acabados, enfrentam um desafio: o baixo escoamento de suas mercadorias. Quando o consumo de roupas, toalhas e lençóis diminui no varejo, as confecções reduzem seus pedidos, e esse efeito cascata chega até a fiação, que adota uma postura cautelosa na compra de novos lotes de algodão. Elas compram apenas o suficiente para manter a produção rodando, sem formar grandes estoques, aguardando um sinal de aquecimento da economia.

Para o produtor, isso significa que a demanda interna, embora presente, não tem força para impulsionar os preços. A indústria nacional precisa do algodão, mas negocia de forma mais comedida. É importante entender a jornada completa da pluma para visualizar esse impacto. O algodão que sai da fazenda pode virar:

  • Fios para a produção de malhas e tecidos planos.
  • O jeans que usamos no dia a dia.
  • As confortáveis toalhas de banho e roupas de cama.
  • Produtos médicos, como gazes e curativos.
  • Componentes para a indústria automobilística e de decoração.

O termômetro dos preços e a estabilidade das cotações

Essa dinâmica de forças opostas – exportação forte versus mercado interno fraco – resulta em cotações que oscilam dentro de uma faixa relativamente estreita. Conforme aponta o levantamento do Cepea, os preços têm variado pouco, acompanhando justamente o comportamento da paridade de exportação. A média mensal em R$ 3,55 por libra-peso, com uma variação de apenas 2,8% entre a mínima (R$ 3,50) e a máxima (R$ 3,61), reflete esse equilíbrio. O preço não dispara porque a demanda interna limita as altas, mas também não cai, pois a alternativa da exportação garante um piso de remuneração atrativo para o produtor.

O que observamos é um mercado de algodão que anda de lado, mas em um patamar elevado. A paridade de exportação, impulsionada pelo dólar e pela demanda asiática, sustenta os preços, enquanto a apatia da indústria nacional impede altas mais expressivas. O produtor que tem qualidade e está apto a exportar encontra um cenário favorável.

Manter-se informado sobre esses indicadores é fundamental. Instituições como a Embrapa Algodão fornecem pesquisas e dados técnicos valiosos, enquanto os boletins do Cepea são ferramentas essenciais para acompanhar a flutuação diária dos preços e entender as tendências que podem afetar a rentabilidade do negócio. A informação, nesse mercado, vale tanto quanto a qualidade da pluma.

O cenário atual para o algodão brasileiro é um claro exemplo de como o agronegócio está conectado globalmente. A força da demanda internacional serve como um verdadeiro alicerce para os preços, oferecendo ao produtor uma via de escoamento rentável e segura. Por outro lado, a cautela do mercado interno acende um alerta sobre a dependência da economia doméstica. Para o cotonicultor, navegar neste ambiente exige uma gestão atenta, com um olho nos contratos de exportação e outro na recuperação do consumo nacional. A qualidade, a sustentabilidade e a informação de mercado continuam sendo os pilares para garantir o sucesso da lavoura, transformando a fibra brasileira em um ativo valioso em qualquer cenário.

AGRONEWS