Intoxicações e mortes por metanol em bebidas adulteradas acendem alerta

Casos em São Paulo expõem fragilidades no combate ao mercado ilegal e preocupam especialistas

Intoxicações e mortes por metanol em bebidas adulteradas acendem alerta
Ilustrativa

A Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) e o Conselho Nacional de Combate à Pirataria e Delitos contra a Propriedade Intelectual (CNCP) publicaram uma nota técnica com recomendações urgentes a estabelecimentos que comercializam bebidas alcoólicas em São Paulo e regiões próximas.

 A medida foi adotada após nove casos de intoxicação por metanol em bebidas adulteradas, que já resultaram em duas mortes em um período de 25 dias.

O metanol é uma substância líquida, inflamável e incolor.

É amplamente utilizado como solvente, na fabricação de combustíveis, plásticos, tintas e medicamentos. Tem grande potencial de intoxicação, e quando consumido pode levar à morte mesmo em doses pequenas.

A substância não pode ser destinada diretamente para consumo humano. A substância tambéms eria usada pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) para adulterar combustível.

De acordo com a Senacon, o objetivo é “orientar o setor privado e desencorajar a ação criminosa de falsificadores e distribuidores irregulares”.

O documento é  voltado a bares, restaurantes, casas noturnas, hotéis, mercados, atacarejos, distribuidores, plataformas de e-commerce e aplicativos de entrega.

Entre as recomendações estão:

comprar bebidas apenas de fornecedores formais, com CNPJ ativo e regularidade no segmento;

exigir nota fiscal e conferir a chave de segurança nos canais da Receita Federal;

rejeitar garrafas com lacres violados, rolhas ou rótulos de baixa qualidade, sem identificação de fabricante, importador ou lote;

adotar medidas de rastreabilidade com dupla checagem.

O documento alerta ainda para sinais de adulteração, como preços muito abaixo do mercado, odor estranho ou relatos de sintomas como visão turva, dor de cabeça intensa, náuseas, tontura e rebaixamento do nível de consciência.

“Não realizem ‘testes caseiros’ (cheirar, provar, acender): tais práticas não são seguras nem conclusivas”, reforça a nota técnica.

Em caso de suspeita, a recomendação é interromper imediatamente a comercialização e orientar consumidores a procurar atendimento médico de urgência.

O estabelecimento deve acionar o Disque-Intoxicação 0800 722 6001 (Anvisa) e notificar órgãos como Vigilância Sanitária, Polícia Civil (197), PROCON e, quando aplicável, o Ministério da Agricultura e Pecuária.

Risco criminal e responsabilidade 

O Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), ao qual a Senacon é vinculada, destacou que a comercialização de bebidas adulteradas é crime previsto no Artigo 272 do Código Penal e também na Lei nº 8.137/1990, que trata das relações de consumo.

O Código de Defesa do Consumidor reforça a responsabilidade dos fornecedores sobre a segurança dos produtos.

“O MJSP reafirma seu compromisso em manter diálogo permanente com o setor privado, fortalecer a cooperação institucional e adotar medidas que garantam segurança aos consumidores brasileiros”, informou a pasta.

Associações reagem

A Associação Brasileira de Bebidas (Abrabe) manifestou “profunda preocupação e solidariedade às vítimas e familiares”, lembrando que apenas em 2025 foram apreendidos mais de 160 mil produtos falsificados, além de insumos e equipamentos.

Segundo a entidade, o trabalho inclui apoio às operações contra a venda de produtos ilícitos e promoção do consumo responsável. “A Abrabe reitera o compromisso com a proteção do consumidor e com a defesa do mercado legal, seguro e responsável”, declarou em nota.

Risco de cegueira

A Associação Brasileira de Neuro-oftalmologia (ABNO) também fez um alerta para os riscos do consumo de metanol, que pode causar neuropatia óptica, doença grave com potencial de levar à cegueira irreversível. 

Segundo a entidade, entre 12 e 24 horas após a ingestão podem surgir sintomas como dor de cabeça, náuseas, vômitos, dor abdominal, confusão mental e visão turva repentina. O diagnóstico deve ser feito por meio da história clínica do paciente, exames de sangue e de imagem. 

O tratamento inclui uso de antídotos (como etanol venoso), bicarbonato para correção da acidez no sangue, vitaminas (ácido fólico/folínico) e, em casos graves, hemodiálise para remover o veneno.