Citros: Chuva traz alívio mas seca ainda ameaça a safra

A chuva no final de setembro favorece florada, mas volume preocupa e deixa o citricultor em estado de alerta para a próxima safra.

Citros: Chuva traz alívio mas seca ainda ameaça a safra
Ilustrativa

O cheiro de flor de laranjeira voltou a tomar conta de algumas áreas do cinturão citrícola de São Paulo e do Triângulo Mineiro na última semana. As chuvas que caíram trouxeram um sopro de esperança, induzindo a abertura das flores e pintando um cenário que todo produtor gosta de ver. No entanto, a alegria inicial vem acompanhada de uma grande dose de cautela. Conforme apontam os pesquisadores do Cepea, o volume de água que chegou ao solo ainda está longe de ser o ideal para reverter o quadro de estresse hídrico que castiga os pomares há meses. Este é um momento delicado, onde cada gota de chuva e cada dia de sol intenso podem definir o potencial produtivo da safra 2026.

O alívio momentâneo e a realidade do déficit hídrico

Quem vive o dia a dia do campo sabe que a chegada da chuva após um período de seca é motivo de comemoração. Ela é o gatilho para a florada, o primeiro passo para uma colheita farta. Contudo, o cenário atual exige uma análise mais profunda. O solo, ressecado por uma longa estiagem, absorve rapidamente a pouca água, e as reservas nos lençóis freáticos continuam baixas. O déficit hídrico acumulado não se resolve com pancadas de chuva isoladas. Para a citricultura, que demanda um regime de chuvas bem distribuído ao longo do ano, a irregularidade é um inimigo silencioso e poderoso.

O ideal para o desenvolvimento saudável dos citros, segundo especialistas da área, é um volume pluviométrico anual em torno de 1.200 a 1.500 milímetros. Relatórios de institutos de pesquisa mostram que diversas microrregiões produtoras não atingiram nem 70% dessa meta nos últimos doze meses. Essa condição de sede prolongada força a planta a entrar em um modo de sobrevivência, economizando energia e, consequentemente, comprometendo funções vitais como a emissão e a fixação de novas flores e frutos. A situação mostra que a chuva no final de setembro favorece florada, mas volume preocupa e muito.

Chuva no final de setembro favorece florada, mas volume preocupa

Este subtítulo, que reflete a frase-foco da análise do Cepea, resume perfeitamente o dilema do citricultor. Por um lado, a umidade estimula a abertura dos botões florais que estavam latentes, aguardando o sinal para se desenvolver. Por outro, a falta de água contínua para sustentar essas flores ameaça o chamado “pegamento” do fruto. É como dar a partida em um carro com o tanque de combustível quase vazio. Ele pode até andar alguns metros, mas não chegará longe. No pomar, isso se traduz em uma alta taxa de queda de flores e chumbinhos (frutos recém-formados), um fenômeno que frustra o produtor e impacta diretamente o volume da colheita futura.

Pesquisadores do Cepea indicam que este contexto coloca o recém-iniciado período de floração em uma situação de risco. A preocupação dos agentes do setor consultados pelo Cepea é que, diante do baixo volume de chuva e de dias bastante quentes, o pegamento seja prejudicado.

Essa preocupação não é infundada. O setor já enfrentou um cenário semelhante na safra de 2025, quando uma florada promissora foi dizimada por uma combinação de seca e calor intenso, resultando em uma quebra significativa da produção. A memória dessa perda recente torna o cenário atual ainda mais tenso, pois o produtor vê a história se repetir e teme por seus investimentos.

O que o produtor pode fazer diante da incerteza climática?

Embora não seja possível controlar o clima, o citricultor pode adotar práticas de manejo para mitigar os efeitos da seca e preparar melhor o pomar para períodos de estresse. A tecnologia e o conhecimento agronômico são os maiores aliados nesse momento. A resiliência do agronegócio brasileiro passa pela capacidade de adaptação e pela busca constante por eficiência, mesmo em condições adversas.

Algumas estratégias que podem fazer a diferença no dia a dia da fazenda incluem:

  • Manejo criterioso da irrigação: Para quem possui sistemas de irrigação, este é o momento de usar a ferramenta com máxima eficiência, aplicando a lâmina de água correta no momento certo, evitando desperdícios e garantindo que a umidade chegue à raiz.
  • Uso de plantas de cobertura: Manter o solo coberto com vegetação (braquiária, crotalária, etc.) ajuda a diminuir a temperatura do solo, reduz a evaporação da água e melhora a infiltração durante as chuvas, além de enriquecer a matéria orgânica.
  • Nutrição equilibrada da planta: Plantas bem nutridas são mais resistentes ao estresse hídrico. A análise de solo e folha é fundamental para ajustar a adubação e fornecer os nutrientes que a planta precisa para suportar o período crítico.
  • Monitoramento constante: Acompanhar de perto as previsões do tempo e as condições de umidade do solo permite tomar decisões mais assertivas sobre tratos culturais e irrigação.

Previsão do tempo e o impacto no mercado de suco

As notícias dos institutos de meteorologia não são as mais animadoras para as próximas semanas. A previsão aponta para temperaturas acima da média e pouca ou nenhuma chuva significativa para o cinturão citrícola. Esse prognóstico quente e seco coloca ainda mais pressão sobre a florada recém-aberta. O mercado, por sua vez, acompanha atentamente cada movimento do clima. O Brasil é o maior produtor e exportador mundial de suco de laranja, e qualquer variação na safra tem impacto direto nos preços internacionais e na indústria de processamento.

Dados de órgãos como o Fundecitrus (Fundo de Defesa da Citricultura) são cruciais para que a cadeia produtiva possa se planejar. Uma primeira florada comprometida pode significar menor oferta de matéria-prima para as indústrias, estoques mais apertados e, consequentemente, volatilidade nos preços. A situação reforça a ideia central de que a chuva no final de setembro favorece florada, mas volume preocupa e define os rumos de um dos setores mais importantes do agronegócio nacional.

Neste momento, o sentimento que prevalece no campo é de uma esperança cautelosa. O produtor fez a sua parte, cuidou do pomar e agora olha para o céu, aguardando as chuvas que são essenciais para garantir a transformação das flores em frutos e, finalmente, em uma safra rentável. As próximas semanas serão decisivas para determinar se o alívio trazido pelas últimas águas será suficiente ou se a seca persistente irá, mais uma vez, desafiar a resiliência da citricultura brasileira.

AGRONEWS