Algodão e a paridade de exportação entenda o cenário

Compreender a paridade de exportação é chave no mercado do algodão

Algodão e a paridade de exportação entenda o cenário
Ilustrativa

O mercado do algodão brasileiro acendeu um sinal de alerta. Segundo um levantamento recente do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), o Indicador da pluma voltou a operar abaixo da paridade de exportação, um cenário que não era visto desde o final de 2024. Para o produtor rural, essa notícia pode parecer técnica demais, mas seu impacto é direto na rentabilidade da lavoura.

Entender o que é a paridade de exportação e por que ela está em baixa é fundamental para navegar em um ambiente de negócios cada vez mais complexo. Fatores como a cotação do dólar, os preços nas bolsas internacionais e até mesmo a geopolítica global influenciam diretamente o valor que o cotonicultor recebe por seu produto aqui no Brasil.

O que é a paridade de exportação do algodão?

Pense na paridade de exportação como um termômetro financeiro para a exportação. Ela não é um preço fixo, mas sim um cálculo que indica qual seria o preço equivalente no mercado interno para que a venda ao exterior seja financeiramente vantajosa. Em outras palavras, é o valor que o produtor receberia pela sua pluma se a vendesse para outro país, já descontando todos os custos envolvidos na operação. Se o preço praticado no Brasil está acima desse valor, é mais lucrativo vender para a indústria nacional. Se estiver abaixo, como agora, a exportação se torna menos atrativa.

Esse cálculo complexo leva em conta diversas variáveis que flutuam diariamente, tornando o mercado extremamente dinâmico. A fórmula para se chegar à paridade de exportação considera os seguintes elementos principais:

  • O preço do contrato futuro de algodão na Bolsa de Nova York (ICE Futures), que é a principal referência mundial.
  • O prêmio de qualidade do algodão brasileiro, geralmente medido pelo Índice Cotlook A.
  • A taxa de câmbio, ou seja, a cotação do dólar em relação ao Real.
  • Os custos logísticos e operacionais para levar o produto até o comprador final, como frete terrestre e marítimo, seguro e taxas portuárias.

Quando analistas do Cepea apontam que o indicador nacional está abaixo da paridade de exportação, o recado é claro: a combinação de preços internacionais mais baixos e um dólar menos favorável tornou a venda externa menos rentável no momento, pressionando as cotações dentro do país.

Fatores que pressionam os preços no mercado atual

A recente queda na paridade de exportação não foi causada por um único fator, mas por uma combinação de eventos no Brasil e no exterior. O primeiro deles é a taxa de câmbio. A desvalorização do dólar frente ao Real, observada no início do ano, impacta diretamente a conta do exportador. Como as negociações internacionais são feitas na moeda americana, um dólar mais fraco significa menos reais no bolso do produtor ao converter o valor da venda, o que reduz a atratividade de exportar.

Somam-se a isso as quedas nos próprios referenciais de preço internacionais. Tanto o Índice Cotlook A quanto os contratos negociados na Bolsa de Nova York (ICE Futures) registraram baixas. Esse movimento pode ser reflexo de uma demanda global mais fraca, influenciada por instabilidades geopolíticas e incertezas econômicas nas principais nações consumidoras de algodão. Quando a procura diminui, a tendência é que os preços caiam.

Internamente, o Brasil também enfrenta um cenário de maior oferta da pluma. Safras recordes, resultado de investimentos em tecnologia e manejo, aumentam a disponibilidade do produto no mercado. De acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o país tem se consolidado como um dos maiores produtores globais, e essa grande oferta, quando combinada com um cenário externo desfavorável, exerce uma pressão adicional para baixo sobre os preços domésticos.

O que significa o indicador abaixo da paridade de exportação?

Na prática, quando o preço interno opera abaixo da paridade de exportação, o mercado se ajusta. As tradings e exportadores perdem parte do incentivo para comprar a pluma no Brasil e vendê-la no exterior, pois a margem de lucro diminui consideravelmente. Com menos compradores focados na exportação, a demanda interna precisa absorver uma fatia maior da oferta, o que acaba por forçar uma renegociação de preços para baixo.

Pesquisadores do Cepea explicam que, no Brasil, “a pressão sobre as cotações veio justamente desse contexto internacional, da instabilidade geopolítica e da maior oferta da pluma”.

Esse fenômeno cria um ciclo: a queda na paridade de exportação desestimula as vendas externas, o que aumenta a oferta interna e, por consequência, pressiona ainda mais os preços pagos ao produtor. Embora uma pequena recuperação do dólar nos últimos dias tenha ajudado a elevar um pouco a paridade, o cenário ainda exige cautela e um monitoramento constante por parte de todos os elos da cadeia produtiva.

O papel do Brasil como gigante do algodão mundial

É impossível analisar o mercado do algodão sem considerar a posição de destaque do Brasil. Nas últimas décadas, o país deixou de ser um importador para se tornar uma potência exportadora. Atualmente, o Brasil figura entre os cinco maiores produtores e é o segundo maior exportador de algodão do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Esse protagonismo foi conquistado com muito investimento em pesquisa, tecnologia e, principalmente, em sustentabilidade.

Instituições como a Embrapa Algodão foram cruciais para o desenvolvimento de variedades mais produtivas e adaptadas aos diferentes biomas brasileiros, especialmente o Cerrado. Além disso, programas de certificação como o Algodão Brasileiro Responsável (ABR), da Abrapa, garantem que a produção siga rigorosos critérios sociais e ambientais, agregando valor à pluma brasileira no competitivo mercado internacional. Essa reputação de qualidade e sustentabilidade é um ativo importante, mas não torna o setor imune às volatilidades de preço.

Estratégias para o produtor em um cenário volátil

Para o cotonicultor, um cenário de preços pressionados e indicador abaixo da paridade de exportação exige uma gestão ainda mais eficiente e estratégica. Ficar refém das oscilações do mercado spot (venda imediata) pode ser arriscado. Por isso, a adoção de ferramentas de gestão de risco, como a trava de preços em contratos futuros ou outras modalidades de hedge, torna-se uma alternativa para garantir uma margem de lucro previsível.

Acompanhar de perto as tendências do dólar, os relatórios de safra globais e os indicadores de mercado, é mais do que uma boa prática, é uma necessidade. A informação de qualidade permite antecipar movimentos e tomar decisões de venda mais assertivas. Além disso, continuar investindo na qualidade da pluma, na eficiência da colheita e no beneficiamento pode criar diferenciais que garantem melhores condições de negociação, mesmo em momentos de baixa.

O cenário atual do algodão demonstra a forte conexão entre a lavoura no Brasil e os acontecimentos globais. A queda do indicador abaixo da paridade de exportação é um reflexo dessa dinâmica, onde câmbio, preços internacionais e oferta local se entrelaçam para definir a rentabilidade do produtor. Navegar por essas águas turbulentas exige não apenas habilidade no campo, mas também uma visão atenta e estratégica do mercado, transformando informação em uma poderosa ferramenta de gestão.

AGRONEWS