Mudanças em preços de leite e impacto na produção: analisando as elasticidades

Publicado no dia 09/08/2024 às 10h48min
A pecuária de leite no Brasil tem passado por transformações importantes em termos espaciais, tecnológicos e nos sistemas de produção.

A pecuária de leite no Brasil tem passado por transformações importantes em termos espaciais, tecnológicos e nos sistemas de produção. Tem sido observados ganhos elevados de produtividade e consolidação no campo.

Em termos espaciais, o estado de Minas Gerais lidera isolado a produção nacional, com 27% do leite brasileiro, de acordo com a Pesquisa Pecuária Municipal do IBGE. No entanto, apesar da dimensão da produção nacional, o volume de leite ficou estagnado na última década. Neste sentido, têm sido observadas duas dinâmicas distintas no setor lácteo nacional. Por um lado, grupos de produtores deixando a atividade, com baixa remuneração, baixa tecnologia ou mesmo por falta de sucessão na atividade. Por outro lado, têm-se produtores com aumento de produção e produtividade das vacas, com maiores investimentos, uso intensivo de tecnologias, fomento na gestão das fazendas e utilização de práticas inovadoras para incrementar a produção final e equilibrar seus custos de forma sustentável.

Neste contexto, existe também uma questão importante relacionada ao volume de leite produzido nas fazendas e como estes estratos de volume se posicionam diante de cenários de preço do leite. A política brasileira de pagamento pelo leite, com elevada bonificação por volume, tem papel fundamental no direcionamento da atividade. Como estes estratos de produção têm respondido a estímulos de preços, ou seja, qual a elasticidade-preço da oferta?

O objetivo desta análise é explorar este tema, com base em dados gerenciados pela empresa de consultoria Labor Rural. A avaliação considerou dados de janeiro/2023 a dezembro/2023, de centenas de fazendas, divididas em três estratos de produção, sendo o primeiro com fazendas de produção média diária de até 650 litros, o segundo com produção entre 650 e 2.000 litros/dia e o terceiro com volume diário superior a 2.000 litros de leite.

A elasticidade-preço da oferta é um indicador econômico que ilustra a resposta, em produção de leite, a variações no preço do leite. Em outras palavras, este indicador busca entender qual seria o aumento percentual na produção em função de uma alta percentual no preço. Da mesma forma, caso haja uma queda de preço, qual seria o recuo na produção. Indicadores menores que 1 indicam que a oferta é inelástica a preços, ou seja, a oferta é pouco sensível a alteração em preços. Indicadores superiores a 1 indicam uma oferta elástica e com maior resposta a mudanças em preços.

Pelos resultados, é possível observar dois movimentos distintos. O primeiro é que a elasticidade-preço da oferta aumenta à medida que a produção diária cresce. Ou seja, fazendas com maior volume diário de produção de leite tendem a responder mais a mudanças em preços. A segunda observação é que a produção de leite é inelástica a preços nas fazendas de menores produções, ou seja, aumentos ou quedas de 1% em preço geram respostas em oferta menores que 1%. O contrário é observado no grupo com produção diária superior a 2.000 litros diários, onde a oferta mostrou-se elástica. Neste caso, um aumento de 1% em preço causa um aumento médio na produção de 1,75% (Figura 1).

Figura 1: Elasticidade-preço da oferta de leite por diferentes estratos de produção diária.

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Elasticidade-preço da oferta de leite por diferentes estratos de produção diária

Fonte: Labor Rural/CILeite-Embrapa.

Estes resultados auxiliam no entendimento de dois movimentos produtivos e de consolidação em curso no mercado brasileiro de leite. No caso da consolidação, é uma tendência que tem sido observada na cadeia produtiva do leite, com produtores aumentando a produção visando economias de escala e melhor rentabilidade. Essa consolidação é bem ilustrada com os Top 100 do Brasil, em levantamentos do MilkPoint, que já respondem por quase 4% do leite inspecionado do país. Essa participação era de apenas 2% há 10 anos atrás.

A bonificação por volume, na precificação do leite, também vem incentivando este crescimento na produção média por fazenda. Neste caso, a análise das elasticidades indicou que os aumentos de preços acabam levando produtores maiores a produzirem mais, seja via aumento no número de vacas ou ganhos em produtividade das vacas. O fato é que os grandes produtores crescem mais rapidamente que os pequenos e ganham participação na oferta nacional de leite. No entanto, o somatório dos produtores pequenos ainda representa parcela significativa do leite nacional e exige um olhar mais cauteloso neste tema.

O segundo movimento se refere a uma produção de leite com maiores oscilações. Da mesma forma que incremento de preço leva ao aumento de produção, a queda de preços também induz a contração da produção. Esses dois fatores acabam levando a um incremento na volatilidade do mercado, já que excessos ou escassez de oferta tem forte impacto nos preços. No passado oscilações na produção não eram tão visíveis e pronunciadas e a produção brasileira sempre seguiu crescendo, com maior resiliência.

A Pesquisa Trimestral do Leite do IBGE, que traz o volume de produção sob inspeção, foi iniciada em 1997 e até 2014 a produção do Brasil cresceu ininterruptamente, mesmo com períodos de aperto de margens e cenários diversos de preços do leite. Ou seja, aparentemente uma produção inelástica a preços. No entanto, nos anos recentes o cenário mudou, com a produção recuando em 2015 e 2016, e posteriormente em 2021 e 2022. Uma possível explicação é o fato de que os maiores produtores representam parcela crescente da oferta nacional e fazem ajustes mais rápidos na produção de leite em função do cenário de rentabilidade e sua maior elasticidade-preço da oferta.

O mercado de leite enfrenta desafios e oportunidades, a colaboração entre produtores, pesquisadores e formuladores de políticas é fundamental para garantir um setor sustentável e próspero.

Fonte: MilkPoint

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