"Crime organizado está por trás dos incêndios em São Paulo", diz presidente da Faesp
Usinas e postos pertencentes a facção criminosa teriam motivação econômica para atos orquestrados
O presidente da Federação da Agricultura do Estado de São Paulo (Faesp), Tirso Meirelles, revelou que motivações econômicas do crime organizado são a principal hipótese por trás dos incêndios sem precedentes nos canaviais paulistas.
O executivo avaliou, durante o evento Top Farmers, que ocorre até amanhã em Campinas, que focos de fogo com tal magnitude não podem ter causas naturais ou mesmo acidentais.
"Não é possível que bitucas de cigarro ou cacos de vidro sejam responsáveis por tantos focos ao mesmo tempo. Os incêndios foram, sem dúvida, criminosos e orquestrados", afirmou Meirelles.
Meirelles mencionou que, até o momento, 22 pessoas foram presas, e inquéritos estão sendo conduzidos para apurar os responsáveis pelos incêndios.
“O que ocorreu em São Paulo tem sinais claros da ação de uma organização criminosa com motivação econômica. Como não conseguem competir no mercado, eles tentam pressionar de outras formas”, disse.
O presidente da Faesp, inclusive, revelou haver indícios de que postos de gasolina e até algumas usinas pertencentes à tal organização estariam envolvidos no “dia do fogo” paulista.
Tais estabelecimentos atuariam sem emissão de notas fiscais para lavagem de dinheiro.
Entre as primeiras prisões, de fato, um dos detidos mencionou à polícia estar cumprindo ordens de uma facção criminosa que atua no estado e além de suas fronteiras.
Meirelles elogiou o governo de Tarcísio de Freitas pela resposta rápida às emergências e ressaltou o apoio da Polícia Civil, Polícia Federal e das forças de segurança para investigar e punir os responsáveis.
Além disso, mencionou o uso de tecnologia como satélites para identificar a origem dos focos de incêndio e seus responsáveis. "O governador é firme, e as pessoas responsáveis por essa tragédia estão sendo investigadas e confiamos que serão punidas", disse.
Suspeita do setor
A hipótese de envolvimento do crime organizado na série de incêndios no estado já era ventilada em aplicativos de conversas nas redes sociais, como o WhatsApp e o Telegram.
Um áudio apócrifo (sem autoria) sobre o tema foi compartilhado em diferentes grupos. O conteúdo teria sido gravado por um funcionário de uma usina e comenta supostas ações da facção criminosa.
Segue a transcrição:
"Você não tem ideia do que fizeram com a gente. O crime organizado comprou usinas na região, em Catanduva e até em Goiás. Agora, o PCC tem usinas, mais de mil postos vendendo combustível sem pagar imposto e ninguém faz nada. Eu denunciei ao governador, ele começou a fiscalizar e, como resposta, colocaram fogo no estado. Fizeram incêndios em cinco ou seis pontos, a favor do vento, contra nós. Metade da usina queimou. Em 40 anos, plantei 2 milhões de árvores e 1.500 hectares de matas. Nós criamos florestas com tamanduás, macacos, onças e veados. E eles queimaram tudo. Sexta e sábado passado, 6 mil hectares queimados, não sobrou uma árvore de pé. Ontem, recolhi tamanduás queimados para levar ao zoológico de Ribeirão para tratamento. Você não acredita no que está acontecendo. E o pior é que temos governos que protegem bandidos. Agora o estrago é enorme, e a gente avisou há tempos sobre esses incêndios criminosos. Não há ajuda. Como você disse, estamos perdidos. Vamos ter que pegar em armas ou pagar proteção para o crime organizado, como os agricultores no México, que estão nas mãos dos cartéis. Lá, não se planta um pé de abacate sem pagar ao cartel. Um abraço para você porque rezar não vai adiantar mais. Já rezei demais".
Anistia aos produtores afetados
Tirso mencionou ainda a solicitação feita ao governador para um decreto que proteja os produtores afetados pela destruição de Áreas de Preservação Permanente (APP) e reservas legais.
Meirelles explicou que o pedido à administração estadual visa conceder uma anistia para áreas que foram queimadas criminosamente, isentando os produtores de punições que o Código Florestal impõe a áreas de APP e reserva legal que são destruídas por incêndios.
"Não podemos permitir que os produtores sejam penalizados por algo que não têm culpa. Foi um ato criminoso e precisa ser tratado como tal", argumentou.
O presidente da Faesp estimou as perdas econômicas em quase R$ 2 bilhões, afetando diretamente produtores de café, cana-de-açúcar e pecuária. "Além das lavouras, tivemos mortes, destruição de equipamentos e danos à infraestrutura de muitas propriedades", afirmou.
Ele ressaltou a importância do apoio do governo estadual e a atuação do governo, que liberou recursos significativos para combate aos incêndios, além de formar um comitê de emergência com autoridades militares.
Segundo ele, a Faesp já está se mobilizando para evitar novos desastres e ataques nos próximos anos com a possibilidade de mais secas severas.
Sem paralelo
O presidente da Faesp relembrou o cenário de três anos atrás, quando o estado enfrentou secas severas, geadas e tempestades de vento, mas, ainda assim, não houve alteração significativa no número de focos de fogo.
"Fizemos um trabalho preventivo muito grande. Mas o que aconteceu agora não tem como ser acidental, é impossível que de Batatais a Araçatuba tudo tenha pegado fogo", declarou.
Meirelles explicou que a federação trabalhou junto a concessionárias de rodovias para limpar as laterais das estradas e evitar que bitucas de cigarro ou faíscas causassem incêndios com grandes faixas de aceiros.
Confira a entrevista:
"Como podem ter ocorrido tantos incêndios ao mesmo tempo no estado de São Paulo?
Não há como esses incêndios serem causados por bitucas de cigarro ou cacos de vidro em tantos lugares ao mesmo tempo. Isso foi claramente criminoso. Não há como, de Batatais a Araçatuba, todos esses incêndios serem acidentais.
Há três anos, enfrentamos uma seca, geada e ventos severos. Fizemos um grande trabalho preventivo junto às concessionárias de rodovias para limpar as laterais e evitar que faíscas causassem incêndios. Prevenimos até mesmo incêndios acidentais, mas o que vimos agora foi algo criminoso.
Qual o impacto financeiro desses incêndios no agronegócio?
As perdas econômicas já chegam a quase R$ 2 bilhões. Isso inclui perdas na produção de café, cana-de-açúcar, pecuária e também mortes de animais e danos a equipamentos e estruturas das propriedades.
O que a Faesp está pedindo ao governo em relação a essas perdas?
Pedimos um decreto que anistie os produtores que tiveram áreas de APP ou reserva legal queimadas de forma criminosa. Isso é importante porque, de outra forma, eles seriam punidos injustamente.
Esses incêndios foram causados por ação criminosa isolada ou orquestrada?
Foi orquestrado. Não foi apenas uma pessoa agindo isoladamente. Existem evidências de que isso foi uma ação coordenada, até mesmo para atingir algumas usinas. Tiveram que esvaziar a Usina Santa Elisa por conta de riscos de explosão.
O crime organizado pode estar por trás dos incêndios?
Sim. Há indícios de que o crime organizado, possivelmente ligado a interesses econômicos, está envolvido. Existem interesses de mercado que tentam desestabilizar a produção. Alguns postos de gasolina e até usinas estão sob suspeita.
Como o governo estadual tem apoiado a resposta a esses incêndios?
O governador Tarcísio de Freitas foi firme e rápido em liberar recursos e apoio. Além disso, a Polícia Civil, a Polícia Federal e a Secretaria de Segurança Pública estão investigando, utilizando satélites e outras tecnologias.
Até o momento, 22 pessoas foram presas e estão sendo investigadas. Além disso, o governador Tarcísio de Freitas liberou orçamento para combate aos incêndios, mobilizou grandes equipes e equipamentos como helicópteros e aviões, e formou um comitê de emergência.
Quando podemos esperar que os responsáveis sejam identificados?
O governador Tarcísio de Freitas é firme e as investigações continuam. Estamos trabalhando para que os culpados sejam identificados, e já estamos formando grupos de trabalho para prevenir que isso aconteça novamente.
Quais medidas preventivas a Faesp pretende adotar para o futuro?
Já estamos nos mobilizando para o próximo ano, se tivermos uma seca similar. Precisaremos de mais brigadas de incêndio, caminhões-pipa e mais monitoramento por satélite. Também faremos plantões para evitar que incêndios se alastrem dessa forma."
Daniel Azevedo Duarte
Agrofy News
Editor-chefe do Agrofy News Brasil