CRISE ENERGÉTICA, DESAFIOS CLIMÁTICOS E O PAPEL DO BRASIL

Publicado no dia 18/11/2021 às 11h12min
CRISE ENERGÉTICA, DESAFIOS CLIMÁTICOS E O PAPEL DO BRASIL

Segue artigo sobre os resultados da COP-26 que publicamos no Jornal Valor Econômico em 9/11, com pequenos ajustes que refletem os resultados da Conferência na questão energética global. Enviamos também convite para o nosso próximo webinar, que ocorrerá nessa quinta dia 18/11 às 18:00 horas.

CRISE ENERGÉTICA, DESAFIOS CLIMÁTICOS E O PAPEL DO BRASIL

Claudia Cheron König
Marcos Sawaya Jank 

A COP-26 se encerrou e tivemos avanços na regulamentação do livro de regras do Acordo Climático de Paris, principalmente em relação à operacionalização do mercado global de carbono, ainda que o tema do financiamento dos países mais pobres não tenha avançado. No final, o Brasil participou de forma consistente e proativa das negociações e voltou para o centro da mesa, apesar da dívida de eliminação do desmatamento ilegal, que agora precisa ser cumprida até 2028.

Pela primeira vez desde a Rio-92, a COP-26 traz uma menção clara sobre a necessidade de redução gradual do consumo de fontes fósseis, mas sem um comprometimento mais efetivo dos países ricos para isso. Certamente a crise energética global que eclodiu nos últimos meses teve parte da responsabilidade pelo afastamento dos países em relação a maiores compromissos nessa área.

Nos últimos meses o mundo assistiu a crise energética da China, país que depende fortemente de térmicas a carvão, ao mesmo tempo que o preço da eletricidade na Europa atingiu níveis recordes por conta de problemas de abastecimento de gás natural e do baixo volume de ventos para as eólicas. Desde maio último, os preços internacionais do petróleo, carvão e gás natural dobraram. Com a aproximação de um inverno rigoroso e a população enfrentando diariamente as consequências da alta de energia, ficou difícil para os governantes defenderem qualquer meta mais rigorosa de redução de energias fósseis.

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A mudança em direção a uma frota dominada por carros elétricos vem sendo continuamente anunciada pelos países desenvolvidos e pelas grandes empresas automobilísticas. Mas a UE já admitiu que em 2030 os carros europeus ainda serão movidos, majoritariamente, por combustíveis fósseis. Isoladamente a eletrificação veicular não conseguirá atingir a diminuição de CO2 necessária para cumprir as metas do Acordo de Paris.

A crise energética atual chama a atenção para a insegurança e volatilidade das energias renováveis intermitentes (eólica e biomassa, por exemplo) e os riscos geopolíticos dessa crise já se traduzem no aumento da inflação mundial, no menor crescimento econômico dos países e na redução do apoio para a transição em direção a energias de baixo carbono.

Ainda há um longo caminho a ser percorrido pelo mundo até que a oferta de energia renovável aumente. As fontes fósseis respondem por 83% da energia global e são responsáveis por dois terços das emissões de gases de efeito estufa. 

 

 

A pressão pela mudança acelerada da matriz energética global fez com que os investimentos em exploração de óleo e gás caíssem pela metade, passando de 840 para 420 bilhões de dólares entre 2014 e hoje. A retomada do crescimento da Europa depende cada vez mais das diretrizes e humores de Vladimir Putin na Rússia.

Essa situação não será alterada no cenário atual. A transição para uma economia de baixo carbono é necessária e inevitável, mas não será feita da noite para o dia. Apesar de uma diminuição no uso de petróleo e carvão, o gás natural continuará tendo um papel crucial no mundo energético.

Além disso, estamos vivendo o risco de uma transição energética mal administrada, com forte influência da China, que vive uma crise energética sem precedentes, ao mesmo tempo em que domina a fabricação de componentes-chave no mundo: 72% dos módulos solares do mundo, 69% das baterias de íon-lítio e 45% das turbinas eólicas, além de controlar grande parte do refino de minerais essenciais para a energia limpa, como cobalto e lítio.

 

 

Neste contexto, o hidrogênio tem sido apontado como um agente fundamental da transição energética, sendo uma fonte de energia de baixo carbono, especialmente em setores que são difíceis de eletrificar. Apesar de não ser fonte primária de energia, o hidrogênio pode ser usado como elemento para armazenar e transportar energia a granel. Se a energia renovável for convertida em hidrogênio, ela pode ser armazenada a baixo custo por longos períodos, e convertida em eletricidade quando necessário. Desta maneira, locais ensolarados e ventosos podem exportar energia limpa através do hidrogênio. A expectativa é alta: já são mais de 350 grandes projetos de produção de hidrogênio em andamento e o investimento acumulado pode chegar a US$ 500 bilhões até 2030. O Morgan Stanley estima que as vendas anuais de hidrogênio podem chegar a US$ 600 bilhões até 2050, um grande crescimento em relação às vendas atuais de US$ 150 bilhões. Contudo, o processo de obtenção do hidrogênio continua caro, o que significa que essa alternativa mais ecológica ainda não é competitiva. 

No cenário atual da crise energética global pode-se dizer que a desaceleração da transição é inevitável, o que desestabilizará a solução climática que foi discutida na COP-26. A médio prazo, os críticos sugerem que os formuladores de políticas da UE devem se concentrar em formas realistas de reduzir o uso de petróleo, como o uso de biocombustíveis convencionais e avançados. Veículos elétricos não são carros de emissão zero. As emissões dos automóveis devem ser medidas em uma base correta, não apenas no escapamento do automóvel, mas sim considerando o ciclo de vida completo do transporte, o que inclui as emissões à montante na produção da eletricidade que será usada nos veículos.

Além da redução da poluição nos grandes centros, há uma pauta geopolítica para a Europa eleger o carro elétrico como solução para a mobilidade. A eletrificação resolve o problema de dependência que o continente tem em relação aos combustíveis fósseis. Adotar biocombustíveis como solução para a redução de CO2 seria manter a dependência de matérias-primas importadas. Contudo, a União Europeia precisa se concentrar na quantidade de petróleo usada a cada ano no seu setor de transporte. As políticas adotadas até aqui não proporcionarão a descarbonização almejada do transporte europeu.

A COP26 prometia trazer para o centro das discussões o fato que não há mais tempo a perder, o que foi postergado. Ao contrário da eletrificação e das células de hidrogênio, que ainda necessitam altos investimentos em desenvolvimento de tecnologias e infraestrutura, os biocombustíveis, e em especial o etanol, apresentam a possibilidade de implementação imediata, com o uso da infraestrutura vigente e gerando a redução instantânea de gases de efeito estufa.

O etanol é um biocombustível de baixo risco gerado pela cana de açúcar, que também produz biogás e bioeletricidade. O projeto brasileiro de descarbonização da matriz energética por meio de biocombustíveis (conhecido como Renovabio) é uma forma concreta de avançar na transição energética por meio de um sistema de incentivos de preços efetivos e transparentes. 

 

 

O fato é que o carbono (emissões de CO2) ainda precisa ser adequadamente precificado no mundo, de forma a permitir, na prática, a transição para as energias de baixo carbono. Não podemos postergar e nem ignorar a necessidade de incentivos por meio do sistema de preços para fazer uma transição gradual para projetos energéticos que gerem lucros, empregos e renda, e ao mesmo tempo em que reduzam as emissões de gases de efeito estufa.

Claudia Cheron König, Pesquisadora sênior do Insper Agro Global. Mestre em Negócios Internacionais na Alemanha e Doutora pela FEA-USP.

Marcos Sawaya Jank, Professor de Agronegócio Global do Insper.

Fonte: PORTAL GHF

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