O que está em jogo com o corte nos recursos de subvenção do Plano Safra?
Montante destinado ao crédito agrícola, seguro rural e apoio à comercialização pode ser 26% menor do que o previsto pelo governo federal
A proposta orçamentária do governo federal para 2021 previa R$ 10,3 bilhões para subvenções econômicas na agropecuária, incluindo crédito agrícola, seguro rural e apoio à comercialização. Porém, o relator-geral do Orçamento, Marcio Bittar (MDB-AC), cortou R$ 2,75 bilhões (cerca de 26%) desse valor, que caiu para R$ 7,55 bilhões.
A medida preocupa o setor, que esperava um Plano Safra 2021/22 robusto o suficiente para dar suporte à expansão da atividade no Brasil. De acordo com o Ministério da Agricultura, nem os R$ 10,3 bilhões seriam suficientes para atender toda a demanda do próximo ciclo.
Além do aumento na área plantada, também há uma alta de pelo menos 20% nos custos de produção. Em alguns produtos e regiões, os gastos subiram ainda mais nos últimos 12 meses. Isso exigirá mais recursos por hectare plantado, tanto para crédito como para o seguro rural.
Também pesa a perspectiva de aumento na Selic. É esperado que, até o fim deste ano, a taxa básica de juros chegue a 5% ao ano. Desta forma, a subvenção do crédito – principalmente para a agricultura familiar – precisará de mais dinheiro no Plano Safra.
Em janeiro, quando ainda não se sabia exatamente como ficaria o Orçamento de 2021. O Ministério da Agricultura havia solicitado à pasta da Economia R$ 15 bilhões para equalização no Plano Safra 2021/22. Foi, inclusive, a ministra Tereza Cristina também tinha solicitado esse valor no ciclo 2020/21, mas o setor foi contemplado com apenas R$ 11,5 bilhões na época.
De acordo com o Instituto Pensar Agro, o governo federal deve vetar parte do Orçamento aprovado pelo Congresso Nacional, sendo forçado a enviar um Projeto de Lei do Congresso Nacional (PLN) para corrigir as distorções causadas pelos vetos.
“Somente após a sanção da Lei Orçamentária Anual (LOA) e o eventual envio desse PLN é que será possível traçar uma estratégia para tentar corrigir as distorções apontadas”, diz a entidade.
Onde foram feitos os cortes?
Percentualmente, o maior corte se deu no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). O governo federal havia previsto cerca de R$ 3,85 bilhões para equalização, mas o valor foi reduzido em 35%, caindo para R$ 2,5 bilhões. Já os recursos para equalização do crédito rural para pequenos e médios produtores foram cortados em 28,4%, saindo de R$ 4,389 bilhões para R$ 3,142 bilhões.
O montante destinado à equalização do Prêmio do Seguro Rural (PSR), que era para ser de R$ 1 bilhão, ficou em R$ 976 milhões. Já o dinheiro destinado a apoiar a comercialização ficou 6,9% menor do que o previsto pelo Executivo: R$ 7,5 bilhão contra R$ 10,3 bilhão.
Plano Safra em risco?
O economista-chefe da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), Antônio da Luz, afirma que a situação fiscal do Brasil é bastante delicada. Por isso, a entidade acredita que o governo federal precisa enxugar gastos para equilibrar as contas públicas e não gerar problemas ainda maiores no futuro. Ele acredita que isso, querendo ou não, passa pela agropecuária. “Se não ajustarmos as finanças, à medida que piorar, seremos cobrados em impostos”, diz.
Mas o economista não concorda com a forma como o corte foi feito. Para ele, o Congresso Nacional promoveu uma “barbaridade”. Segundo Antônio da Luz, os parlamentares cortaram recursos para itens essenciais, na expectativa de que isso gere um colapso em todo o sistema. Assim, deputados e senadores poderiam aproveitar o caos para se promover, usando recursos das emendas parlamentares para ganhar a gratidão do agronegócio em momentos de crise.
“Tudo isso em um ano de vésperas de eleições. Não tem ajuste fiscal, o que tem é um populismo fiscal, de baixa categoria, do mais baixo nível”, dispara o economista.
Antônio da Luz afirma que a agricultura familiar sentirá um forte golpe se não houver mudanças no Orçamento. “É um setor muito sensível, delicado, qualquer variação pode dar um problema grave. Esse produtor, se ele não conseguir uma determinada quantidade de crédito, ele não vai produzir. Ele não tem de onde tirar recursos, não tem as opções que outros produtores [médios e grandes] têm”, destaca.
E o economista lembra que os produtos da agricultura familiar são consumidos principalmente no mercado interno. Logo, caso o setor tenha problema e a produção caia, a sociedade vai pagar a conta, na forma de aumento de preços.
Além disso, a agricultura empresarial terá que avançar com as fontes de financiamento independentes dos recursos públicos.
A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) diz não medir esforços para fazer a recomposição orçamentária do Ministério da Agricultura, especialmente, no que diz respeito à agricultura familiar. “O governo federal já foi acionado para que consigamos construir uma solução neste sentido”, diz a bancada, em nota.
Na semana passada, a Casa Civil e a Secretaria de Governo, já sob o comando da ministra Flávia Arruda, realizaram reuniões para buscar uma solução para o Orçamento de 2021. Para o ministro da Economia, Paulo Guedes, o texto aprovado pelo Congresso é impossível de ser cumprido.