No Brasil, 60% das cidades não possuem Serviço de Inspeção Municipal
Entre motivos apontados por prefeitos está o custo de manutenção do serviço, falta de pessoal capacitado e demanda;
Apesar do Serviço de Inspeção Municipal (SIM) ser uma exigência legal para governos municipais, apenas 40% das cidades brasileiras possuem o serviço de fiscalização, de acordo com a Confederação Nacional de Municípios (CNM). Entre os principais motivos apontados por prefeitos pela não existência do serviço, estão o custo de manutenção da atividade, a falta de pessoal capacitado e a falta de demanda. Em tese, não haveria agroindústrias ou microempreendedores que exerçam atividades comerciais com produtos de origem vegetal ou animal nas cidades.
O analista técnico de Agricultura da CNM, Osni Rocha, concorda com os prefeitos que os custos de manutenção do SIM podem ser onerosos. Principalmente para as cerca de 3900 cidades brasileiras que possuem menos de 5 mil habitantes. De acordo com ele, o serviço custa em torno de R$10 mil mensais às prefeituras. A crença de falta de demanda, porém, seria equivocada.
“A Confederação Nacional dos Municípios entende que precisa aumentar o diálogo lá na base, no setor produtivo, nos gestores, para mostrar a necessidade à agroindústria. Ás vezes até mesmo o produtor, pelo fato de estar informal, tem medo se aproximar da gestão pública. Tem que haver essa aproximação, ainda q não seja pela agroindústria, mas que seja pelos seus representantes, em especial uma agricultura familiar. A gente sabe que dentro do SIM a grande presença são de pequenos estabelecimentos, então essa distância é grande”, explica.
Rocha aposta que o SIM pode ser um aliado no trabalho de retomada econômica do país, que ainda vive sob os efeitos da pandemia de Covid-19. Para evitar, no entanto, o alto custo para as prefeituras, a saída seria investir em consórcios públicos. Mas, não é apenas a CNM que acredita nesta estratégia. Em fevereiro, o Ministério da Agricultura lançou uma cartilha, em parceria com CNM, Rede Nacional de Consórcios Públicos e Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), para orientar os prefeitos a como montar um consórcio de execução do SIM.
“A figura do consórcio de municípios vem como uma grande oportunidade de solução. Você imagina, 5 ou 6 municípios, cada um com uma agroindústria, ou algo que não seja formalizado. Esses custos vão ser rateados entre seus membros e a agroindústria vai ter o incentivo do comércio intermunicipal”, incentiva Rocha.
A diretora do departamento de Suporte e Normas do Ministério da Agricultura, Judi Maria Nóbrega, explica que um decreto publicado pela pasta em, 2019, e regulamentado em 2020, permite que os produtos inspecionados, em serviços mantidos por consórcios, tem autorização para comercializar as mercadorias em todas as cidades que compõem o consórcio.
“Lembrando que esse decreto, que estabeleceu essa prerrogativa, também traz um prazo de até 3 anos pra esses serviços de inspeção se estruturarem e aderirem ao SISBI/POA, o Sistema Brasileiro de Inspeção dos Produtos de Origem Animal. Com isso, esses serviços passam a permitir que os estabelecimentos sob a sua fiscalização tenham o âmbito de comercio nacional. Veja que é uma política que está sendo estimulada e que traz ganhos gradativos aos municípios e aos estabelecimentos que estão registrados nesses municípios. E, para a população os ganhos são importantes. Além de uma maior segurança nos alimentos, temos um aumento oferta de produtos regionais – que agora está sendo demandado mais do que nunca -, então a politica de organização em consórcios veio pra se estabelecer e traz muitos ganhos pra todos os envolvidos”, defende Judi.
Receita de sucesso
A criação do SIM no município de Pouso Redondo (SC), possibilitado pela Associação dos Municípios do Alto Vale do Itajaí (Amavi), foi o que levou o negócio familiar de Vanessa Izidoro a crescer mais de seis vezes. Proprietária de um frigorífico de peixes desde 2017, as atividades ficaram na informalidade por um ano. Em 2018, o consórcio se integrou ao Serviço Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária (Suasa) e a empresa de Vanessa conquistou o selo de certificação.
“Antes a gente vendia dentro do próprio município. A partir do momento que conseguimos o serviço de inspeção do SIM, expandimos as vendas para cidades vizinhas. No passado, a gente fazia o abate de 600kg de peixes por semana, hoje são mais de 4 mil quilos por semana. Antes, éramos em três na equipe, hoje somos em sete. Isso facilita porque na hora de vender você tem mais qualidade e passa segurança para o cliente”, conta Vanessa.
O diretor-executivo da Amavi, Paulo Tschumi, explica que dos 28 municípios que fazem parte da associação, 23 possuem o SIM. O consórcio trabalha para auxiliar as demais cidades a também estruturarem o serviço dentro dos seus perímetros. Uma médica veterinária, contratada pela associação em 2018, coordena o projeto do Suasa e orienta as equipes locais sobre o trabalho desenvolvido.
“A divisão de despesas ou de custos é idêntica para todos os municípios, todos eles têm a mesma atribuição e o mesmo direito. Temos uma mensalidade que foi estipulada em assembleia dos prefeitos. Em 2018, o valor dentro do consórcio, vinculado ao projeto do Suasa, era de R$ 333,33. Em 2019, foi R$400 e, agora – porque temos outros serviços sendo executados dentro do consórcio-, passamos para R$ 700 em 2021”, explica Tschumi.
A Amavi trabalha para se integrar ao SISBI/POA e, assim, abrir mercados em outros estados e cidades do país. “Essa é uma porteira que se abre para a comercialização a nível nacional buscando uma qualidade do produto, mas também uma renda, uma alternativa tanto para o próprio proprietário dessa agroindústria, como também trazer renda para o município com agregação de valor sob esse produto”, pontua o diretor-executivo.
O Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento da Serra Gaúcha (Cisga) é outro exemplo de consórcio que já sentiu os benefícios econômicos de investir na criação do SIM. “Nós estamos localizados numa região privilegiada que é a serra gaúcha e esses empreendimentos que envolvem produtos de origem animal são importantes. O turista quer levar, comprar alguma coisa do município. Além das agroindústrias, há uma serie de pequenos empreendimentos que vão nos ajudar a fazer com que a gente tenha o produto em cada município, de forma que o turista, quando nos visitar, vai poder levar cada produto com a certeza de que tem qualidade”, diz o presidente do CISGA, Adenir José Dalle.
Para além do serviço de inspeção, tanto Cisga quanto Amavi são consórcios que atuam em outras frentes pelos municípios, como educação, saúde e meio ambiente. Para Dalle, uma vez estruturado o consórcio, são muitas as possibilidades de trabalhos a serem desenvolvidos. “Acho que vale muito a pena, porque hoje o município sozinho não consegue fazer nada. Essa troca de ideias entre todos os municípios, conseguimos desenvolver projetos regionais muito melhor do que trabalhar sozinho. Acho que vale a pena em todas as áreas trabalhar em conjunto”, finaliza.