Identifique sem deixar marcas

Publicado no dia 25/08/2021 às 16h38min
Identifique sem deixar marcas
 
A marcação do gado bovino a fogo é uma prática milenar que resiste bravamente aos efeitos do tempo, da ciência e da tecnologia. Considerada uma tradição, a marca que durante muito tempo foi sinônimo de riqueza e prosperidade, hoje, simboliza o excesso, o abuso e o sofrimento animal. Em alguns países, como o Canadá, Reino Unido e países da União Europeia, as associações de criadores já aboliram a prática de promover queimaduras em seus animais, e várias outros, como Estados Unidos e Austrália, estão em processo.  No Brasil, há iniciativas pontuais semelhantes em dezenas de fazendas, algumas abolindo totalmente a marca a fogo e outras reduzindo o seu uso, ou seja, deixando de usar a marca a fogo para identificar lote, mês e ano de nascimento, número do animal, entre outras identificações.
Apesar dos bons exemplos de sucesso, a discussão segue bastante acalorada no Brasil, país onde grande parte dos produtores se mantém fiel à tradição de marcar o gado a fogo, e onde até mesmo a legislação determina que isso seja feito. Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, nas fêmeas vacinadas contra brucelose, é obrigatória à marcação a fogo na face, ainda que essa marca não represente garantia nenhuma de que o animal tenha, de fato, recebido a vacina. Outro ponto importante é que a maioria dos pecuaristas realizam a marcação a fogo fora do indicado por lei. Isso mesmo! Existe uma lei (4714) do ano de 1965 que diz: "o gado bovino só poderá ser marcado a ferro candente na cara, no pescoço e nas regiões situadas abaixo da linha imaginária, ligando as articulações fêmuro-rótulo-tibial e húmero-rádio-cubital, de sorte a preservar de defeitos a parte do couro de maior utilidade, denominada grupon”, como mostra a figura abaixo.
 
 
 
 
 
Locais onde a lei brasileira permite a marcação a fogo.
Existem várias maneiras de identificar um bovino e não é segredo para ninguém que esse antiquado método de marcação do gado é um grande promotor de dor, sofrimento e estresse aos animais. Pesquisas mostram que a dor não é apenas no momento da marcação e sim que ela pode durar até 8 semanas, quando também ocorre a cicatrização da queimadura. Ainda, há resultados de pesquisa mostrando que a marca a fogo deixa os bovinos mais reativos, tornando os manejos subsequentes mais difíceis de serem realizados. Sendo assim, é preciso destacar que dor, estresse, sofrimento e reatividade não combinam nada com bom desempenho e retorno econômico ao pecuarista e também para o mercado do couro. De acordo com o presidente executivo do Centro das Indústrias de Curtume do Brasil, José Fernando Bello, as perdas de couro correspondem a aproximadamente 1 bilhão de dólares por ano. Por falar em couro, muitos pecuaristas acham que não ganham nada pelo couro de seus animais, quando na verdade ele compõe de 10 a 15% do valor de uma arroba. Ou seja, se tivermos couros mais valorizados, também teremos acréscimo no valor da arroba.
Além dos efeitos negativos ao bem-estar, saúde e produtividade dos animais, a marcação a fogo também traz muitos riscos de acidentes ao homem e ainda uma imagem negativa ao nosso país que vem se destacando cada vez mais no mercado mundial da carne. Um exemplo são as reportagens de ONGs internacionais de proteção e direitos dos animais que utilizam imagens dos manejos brasileiros, com ferro em brasa, passando a mensagem de que os bovinos brasileiros são torturados.
Imagem que a ONG Peta utiliza para mostrar de onde vem o couro utilizado pelas indústrias de carro, reforçando que torturamos os animais. https://investigations.peta.org/calves-face-branded-leather-car-interiors/
Pode não parecer, mas imagens como essa trazem prejuízo, e ele é todo nosso! Em dezembro de 2020 o famoso jornal norte americano (The New York Times) veiculou a seguinte reportagem: “O Brasil é famoso por sua carne, mas o vegetarianismo está crescendo”, a reportagem destaca que o número de vegetarianos no Brasil dobrou em um período de seis anos, o que deu origem a uma crescente indústria baseada em vegetais. Um dos motivos desse crescimento é devido a imagem que o consumidor tem da cadeia produtiva. 
Se ainda não podemos erradicar a marcação a fogo, podemos passar a usá-la de maneira mais responsável e nem todo mundo está alheio a isso. Os empresários da BE.Animal, em parceria com pesquisadores do Grupo de Estudos e Pesquisas em Etologia e Ecologia Animal (ETCO) e pecuaristas de renome como a Carmen Peres, da Fazenda Orvalho das Flores, lançaram em Agosto de 2020 o projeto “Redução da marca a fogo - Uma nova marca para a pecuária brasileira”, que visa conscientizar e reduzir a utilização de marca à fogo no Brasil.
O professor da UNESP de Jaboticabal, diretor do Grupo ETCO e cofundador da BE.Animal, Mateus Paranhos da Costa conta que o projeto nasceu da preocupação e necessidade de conscientização de que a marca a fogo, antes de provocar um dano no couro, é uma agressão à pele do animal. “É uma prática muito antiga, desde o Antigo Egito. Hoje dispomos de tecnologias muito mais avançadas, menos agressivas para os animais e mais eficientes do ponto de vista de controle de rebanho. Então não faz sentido essa prática continuar sendo usada, mesmo que tenha as suas vantagens por ser uma marca permanente e relativamente barata. Entretanto, é preciso levar em conta o custo das horas de trabalho e o sofrimento aos animais”, pondera o professor.
Muitas são as alternativas de substituição da marca a fogo, como brincos, bottons, chips ou tatuagens que, além de diminuir o sofrimento animal, podem facilitar a gestão de dados nas propriedades. Independentemente do método de marcação, um ponto é unanime: Deve ser muito bem realizado e de forma consciente. Por isso deixamos aqui, como uma importante sugestão de leitura, a indicação do Manual de Boas Práticas de Identificação do Grupo ETCO, que pode ser acessado e baixado em PDF no link a seguir: http://www.grupoetco.org.br/arquivos_br/manuais/manual-boas-praticas-de-manejo_identificacao.pdf
Para finalizar, fazemos votos de que todas as boas tradições sejam mantidas e ensinadas, passadas de uma geração à outra e perpetuadas na forma de ensinamento, cultura e até mesmo identidade. Mas que possamos reinventar àquelas que não mais nos representam, sobretudo em relação ao respeito ao s seres vivos, independente da espécie.  
 
 
Artur Andrade Resende e Kauany Nogueira 
Empresa Seres Júnior – Universidade Federal do Mato Grosso - Campus Sinop
Tel.: (66) 99967-1838 Instagram: @seresjr
E-mail:  seresjrbemestar@gmail.com ou seresimv@gmail.com
 
Lucas R. B. Ruiz
Programa de Pós-graduação em Zootecnia – UNESP/Jaboticabal
Grupo de Estudos e Pesquisas em Etologia e Ecologia Animal (ETCO)
 
Fernanda Macitelli
Universidade Federal do Mato Grosso – Campus Sinop
Empresa Seres Júnior
Grupo de Estudos e Pesquisas em Etologia e Ecologia Animal (ETCO)
 
Fonte: UFMT

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